CONtar o mundo

Na maior parte da nossa vida social a imaginação é um modo particular de relação com o mundo. Enquanto modo de relação podemos ser dissociados dela, podemos até falar de imaginação” inconsciente”, mas ela constitui a nossa primeira maneira de fazer a experiência dele.
Olhando esta imagem, pela forma como se é capaz de fazer essa experiência, podemos imaginar que estas laranjas são homens que vemos do alto de um prédio, uma multidão, e que caminham empurrando-se uns aos outros numa rua, à saída de um extraordinário evento.
Cada homem, nesta rua é o “outro” para os outros, cada homem destes pensa o que ele pensa que o outro pensa. O mais alto sentido ético da conexão destes homens é a preocupação recíproca. Afinal ser-se afectado pelas acções ou pelos sentimentos dos outros é “natural”!
Não se espere, porém, que estes homens existam durante muito tempo, como multidão apenas pela virtude de uma experiência unificada. Ao saírem da rua por onde vão, lá mais em baixo, eles desaparecerão, enfrentando uma transformação. Começarão a levantar questões, quando as coisas se tornarem problemáticas, como sempre acontece. O desacordo arrancá-los-á da sua cadência sonolenta e eles serão obrigados a considera o seu próprio ponto de vista por oposição aos que o não partilham.
Resta saber se conseguem resistir a tais confrontações?
CONtar o mundo

Estas laranjas têm uma vida harmoniosa, mesmo plantadas numa caniçada!
Elas têm uma importância muito especial para terem merecido que as tomassem para assunto desta imagem tão rara e bela. Primeiro existiram numa árvore, eram matéria, para depois serem dispostas nesta imagem. Tinham uma situação, singular, à qual foram aplicados certos actos, colocando-as numa outra ordem. Criaram, sem qualquer dúvida, momentos perfeitos, uma espécie de obra de arte.
E como se não bastasse, a brisa que passa produz momentos iguais a notas de uma bela música.
CONtar o mundo
Nunca tive como agora a certeza de que não se deixa um amigo de uma só vez…
As melhores laranjas são para os meus amigos!
Hoje as minhas melhores laranjas são para ti, Esbelta.
A Rapariga das Laranjas
CONtar o mundo

Do epicarpo, muito laranja, de textura fina, para o seu interior, a membrana cobre aquilo que antes de ser fruto era flor.
Em cada gotícula de polpa o RX mostra, que pela seiva da vida, a Laranja, passou de adolescente a madura, transformando-se, num processo de busca de possibilidades de autoconstrução da sua identidade, que a exauriu e a avelhentou;
Em cada gotícula de polpa se vêm as marcas da luta pela auto definição e realização em “cacho”, porque a Laranja se isolou;
Em cada gotícula de polpa se vê incluída, simbolicamente, a viagem iniciática da procura por uma nova vida, onde o “êxito individual” foi medido pela possibilidade da expressão do desejo de SER, porque é Laranja;
Em cada gotícula de polpa, são visíveis as marcas do prazer intelectual, introduzido pelos livros “de verdade”, a que a reflexão conduziu. As Laranjas se pensam que pensam, estão a pensar!
Em cada gotícula de polpa, a “náusea” de não distinguir o presente do futuro, porque o tempo “ que acede lentamente à existência, se faz esperar e quando chega, nos enfatiza, porque conhecemos então que já estava ali havia muito”. As Laranjas têm uma vida breve!
Em cada gotícula de polpa, a acidez por não ter ganho uma qualidade de vida rara e preciosa. Há Laranjas ácidas, mesmo querendo ser doces!
Em cada gotícula de polpa, as marcas visíveis (basta olhar) da luta para salvar aquilo que é, com medo de apodrecer. Todas as Laranjas apodrecem!
Em cada gotícula de polpa, a “náusea” da existência justificada pela pseudo normalidade dos seus actos quotidianos, provavelmente cansada por permanecer suspensa no galho, na monotonia do laranjal;
Em cada gotícula de polpa, a “náusea”por na vida ter gostado e não ter deixado que lhe sucedessem coisas inesperadas, coisas novas, aventuras, para sair do ordinário, sem ser forçosamente para o extraordinário – andar descalça, comer castanhas no meio da multidão desconhecida, correr na areia, coisas de magia.
Em cada gotícula de polpa, a existência de uma verdade inscrita na alma, de origem divina, que alguém lhe roubou.
Em cada gotícula de polpa se nota, pelo RX, que esta Laranja, madura, fracassou.
O RX revelou, também, que esta Laranja tem sementes, que ela própria semeou, com a mesma persistência característica das folhas da laranjeira.